sexta-feira, setembro 26, 2008

Esquerdismo: Doença Infantil do Comunismo IX



IX -O Comunismo de Esquerda na Inglaterra

Na Inglaterra ainda não existe o Partido Comunista, mas entre os operários observa-se um movimento comunista jovem, amplo, poderoso, que cresce com rapidez e permite que se alimentem as mais radiosas esperanças. Há alguns partidos e organizações políticas, ("Partido Socialista Britânico"17 , "Partido Socialista Operário", "Sociedade Socialista do Sul de Gales", "Federação Socialista Operaría"18 que desejam fundar o Partido Comunista e que, para isso, já fazem negociações entre si. O Workers Dreadnought (t. VI, n.º. 48, de 21/11/1920), semanário da última das organizações citadas, dirigido pela camarada Sylvia Pankhurst, publicou um artigo escrito por ela, intitulado, Rumo ao Partido Comunista. Nele está exposta a marcha das negociações entre as quatro organizações citadas para constituir um Partido Comunista único, baseado na adesão à II Internacional o no reconhecimento, em vez do parlamentarismo, do sistema soviético e da ditadura do proletariado. Acontece que um dos principais obstáculos para a criação imediata de um Partido Comunista único é a falta de unanimidade no que concerne à participação no parlamento e à adesão do novo Partido Comunista ao velho "Partido Trabalhista" oportunista, social-chovinista e profissionalista, integrado predominantemente por trade-unions. A "Federação Socialista Operária" e o "Partido Socialista Operário"(1) pronunciam-se contra a participação nas eleições parlamentares e no parlamento, e contra a adesão ao "Partido Trabalhista", discordando quanto a isso de todos ou da maioria dos membros do Partido Socialista Britânico, que, é, na sua opinião, "a ala direita dos Partidos Comunistas" na Inglaterra (pág. 5, artigo citado de Sylvia Pankhurst).
A divisão fundamental é, portanto, a mesma que na Alemanha, malgrado as enormes diferenças de forma em que se manifestam as divergências (na Alemanha essa forma é muito mais parecida "com a russa" que na Inglaterra), além de muitas outras circunstâncias. Examinemos os argumentos dos "esquerdistas".
Ao falar da participação no parlamento, a camarada Sylvia Pankhurst alude a uma carta à Redação do camarada W. Gallacher, publicada no mesmo número, o qual, em nome do "Conselho Operário da Escócia", de Glasgow, escreve:
"Este Conselho é definidamente antiparlamentarista e está apoiado pela ala esquerda de várias organizações políticas. Representamos o movimento revolucionário na Escócia, que pretende criar uma organização revolucionária nas indústrias (nos diversos setores da produção) e um Partido Comunista, baseado em Comitês sociais, no país inteiro. Durante muito tempo altercamos com os parlamentares oficiais. Não achamos necessário declarar-lhes guerra abertamente e eles temem iniciar o ataque contra nós.
Semelhante estado de coisas, porém, não pode prolongar-se muito. Nós triunfamos em toda a linha.
Os membros de base do Partido Trabalhista Independente da Escócia tem uma repugnância cada vez maior pela idéia do parlamento, e quase todos os grupos locais são partidários dos Soviets (no texto inglês emprega-se o termo russo) ou Conselhos Operários. Sem dúvida, isso tem considerável importância para os senhores que consideram a política um meio de vida (como se fosse uma profissão) e põem em jogo todos os métodos para persuadir seus membros a voltarem para o parlamentarismo. Os camaradas revolucionários não devem (todos os grifos são do autor) apoiar esse bando. Nesse terreno, nossa luta será muito difícil. Um dos seus piores aspectos consistirá na traição daqueles cuja ambição pessoal é um motivo mais forte que seu interesse pela revolução. Qualquer apoio ao parlamentarismo eqüivale a contribuir para que o Poder caia nas mãos dos Scheidemann e Noske britânicos. Henderson. Clynes, & Cia são reacionários irrecuperáveis. O Partido Trabalhista Independente oficial cai, cada vez mais sob o controle dos liberais burgueses, que encontraram um refúgio espiritual no campo dos senhores MacDonald, Snowden e companhia. O Partido Trabalhista Independente oficial é violentamente hostil à III Internacional, mas a massa é partidária dela. Apoiar, seja como for, os parlamentaristas oportunistas significa simplesmente fazer o jogo desses senhores. O Partido Socialista Britânico nada significa... Precisa-se é de uma boa organização revolucionária industrial e de um Partido Comunista que atue em bases claras, bem definidas, científicas. Se nossos camaradas podem ajudar-nos a criar ambas as coisas, aceitaremos de bom gosto sua ajuda; se não podem, por Deus, não se metam nisso, se não querem trair a Revolução apoiando os reacionários, que tão cuidadosamente tratam de adquirir o "honroso" (?) (a interrogação é do autor) titulo de parlamentar e que ardem de desejos de demonstrar que são capazes de governar tão bem quanto os próprios "amos", os políticos de classe".
Esta carta à Redação exprime admiravelmente, na minha opinião, o estado de espirito e o ponto de vista dos comunistas jovens e dos operários comuns que apenas começam a chegar ao comunismo. Esse estado de espírito é altamente consolador e valioso: é preciso saber apreciá-lo e apoiá-lo, porque sem ele seria para desanimar da vitória da revolução proletária na Inglaterra (e em qualquer outro país). É preciso conservar cuidadosamente e ajudar com toda a solicitude os homens que sabem expressar esse estado de ânimo das massas e suscitá-lo (pois muito amiúde ele permanece oculto, inconsciente, adormecido). Mas, ao mesmo tempo, é mister dizer-lhes, clara e sinceramente que, por si só, esse espírito é insuficiente para dirigir as massas na grande luta revolucionária, e que esses ou outros erros em que podem incorrer ou incorrem os homens mais fiéis à causa revolucionária são capazes de prejudicá-la. A carta dirigida à Redação pelo camarada Gallacher mostra de modo inconteste, o germe de todos os erros que cometem os comunistas "de esquerda" alemães e em que incorreram os bolcheviques "de esquerda" russos em 1908 e 1918.
O autor da carta está imbuído do mais nobre ódio proletário aos "políticos de classe " da burguesia (ódio compreensível e suscetível de penetrar, por outro lado, não só nos proletários, como em todos os. trabalhadores, todos os "pequenos", para empregar a expressão alemã). Esse ódio de um representante das massas oprimidas e exploradas é, na verdade, o "princípio de toda a sabedoria", a base de todo movimento socialista e comunista e de seus êxitos. Mas o autor não leva em conta, pelo visto, que a política é uma ciência e uma arte que não caem do céu, que não se obtêm gratuitamente, e que se o proletariado quiser vencer a burguesia deve formar seus "políticos de classe", proletários, e de tal envergadura que não sejam inferiores aos políticos burgueses.
O autor compreendeu de modo admirável que não é o parlamento, e sim apenas os Soviets operários que podem constituir o instrumento necessário do proletariado para atingir seus objetivos. E, naturalmente, quem até agora não compreendeu isso, é o pior dos reacionários, mesmo que seja o homem mais culto, o político mais experiente, o socialista mais sincero, o marxista mais erudito, o mais honrado cidadão e chefe de família. Há, porém, uma questão que o autor não apresenta e nem sequer pensa que seja necessário apresentar; se se pode levar os Soviets à vitória sobre o parlamento sem fazer com que os políticos "soviéticos" entrem no parlamento, sem decompor o parlamentarismo estando dentro dele, sem preparar no interior do parlamento o êxito dos Soviets no cumprimento de sua tarefa de acabar com o parlamento. Contudo, o autor exprime uma idéia absolutamente justa ao dizer que o Partido Comunista Inglês deve atuar em bases científicas. A ciência exige, em primeiro lugar, que se leve em conta a experiência dos demais países, sobretudo se esses países, também capitalistas, passam ou passaram há pouco por uma experiência bastante parecida ; em segundo lugar, exige que se levem em conta todas as forças, todos os grupos, partidos, classes e massas que atuam dentro do pais considerado, em vez de determinar a política baseando-se exclusivamente nos desejos e opiniões, no grau de consciência e de preparação para a luta de um só grupo ou partido.
É certo que os Henderson, Clynes, MacDonald e Snowden são reacionários irrecuperáveis. E também é certo que querem tomar o Poder (ainda que prefiram a coalizão com a burguesia), que querem "governar", de acordo com as rançosas normas burguesas e que, uma vez de posse do Poder, procederão inevitavelmente como os Scheidemann e os Noske. Tudo isso é verdade; mas dai não se deduz, absolutamente, que apoiá-los equivale a trair a revolução, mas sim que, no interesse dela, os revolucionários da classe operária devem conceder a esses senhores certo apoio parlamentar. Para tornar clara essa idéia usarei dois documentos políticos ingleses atuais : 1) o discurso pronunciado pelo Primeiro Ministro Lloyd George a 18 de março de 1920 (segundo o texto do The Manchester Guardian de 19 do mesmo mês) e 2) os argumentos de uma comunista "de esquerda", camarada Sylvia Pankhurst, no artigo citado.
Em seu discurso, Lloyd George polemiza com Asquith (que fora convidado especialmente para a reunião, mas que se negou a assisti-la) e com aqueles liberais que querem uma aproximação com o Partido Trabalhista e não a coalizão com os conservadores. (Na carta dirigida à Redação pelo camarada Gallacher vimos também uma alusão à passagem de alguns liberais ao Partido Trabalhista Independente). Lloyd George demonstra que é necessária uma coalizão dos liberais com os conservadores, inclusive uma coalizão estreita, pois de outro modo a vitória pode ser alcançada pelo Partido Trabalhista,. que Lloyd George "prefere chamar" de socialista e que aspira "à propriedade coletiva" dos meios de produção. "Na França isso se chamava comunismo" - explica em linguagem popular o chefe da burguesia inglesa a seus ouvintes, membros do Partido Liberal parlamentar, que, com certeza, até então ignoravam isso - "na Alemanha chamava-se socialismo; na Rússia chama-se bolchevismo". Para os liberais isso é inadmissível por princípio, esclarece Lloyd George, pois os liberais são, por princípio, defensores da propriedade privada. "A civilização está em perigo", declara o orador, razão por que devem unir-se liberais e conservadores...
"... Se vocês forem aos distritos agrícolas - diz Lloyd George - verão conservadas, reconheço, as antigas divisões do partido. Lá, o perigo está longe, não existe. Mas quando o perigo lá chegar, será tão grande como o é hoje em alguns distritos industriais. Quatro quintos de nosso país dedicam-se à Indústria e ao comércio; apenas um quinto vive da agricultura. Eis uma das circunstâncias que sempre tenho em mente quando penso nos perigos com que o futuro nos ameaça. Na França, a população é agrícola e por isso constitui uma base sólida de determinadas opiniões, base que não se modifica tão rapidamente e que não é facilmente excitável pelo movimento revolucionário. Em nosso país a coisa é diferente. Nosso pais é menos estável que qualquer outro, e se se começar a vacilar, a catástrofe aqui será, em virtude dos motivos citados, mais forte que nos demais países".
Através dessas citações, o leitor pode perceber que o Sr. Lloyd George não só é muito inteligente, como também que aprendeu muito com os marxistas. Nós também não faríamos nenhum mal em aprender com Lloyd George.
É igualmente interessante registrar o seguinte episódio da discussão havida depois do discurso de Lloyd George:
"G. Wallace: Gostaria de perguntar como encara o primeiro ministro os resultados de sua política nos, distritos industriais no que concerne aos operários industriais, muitos dos quais são hoje liberais e nos concedem tão grande apoio. Não se pode prever um resultado que provoque um aumento enorme da força do Partido Trabalhista por parte desses mesmos operários que hoje nos apoiam tão sinceramente?
O Primeiro Ministro: Sou de opinião completamente diferente. O fato de os liberais lutarem entre si leva, sem dúvida, um número bastante considerável deles, movidos pelo desespero, para as fileiras do Partido Trabalhista, onde há muitos liberais bastante capazes que hoje se ocupam em desacreditar o governo. O resultado dessa luta entre os liberais, evidentemente, é um importante movimento da opinião pública em favor do Partido Trabalhista. A opinião pública inclina-se não para os liberais que estão fora do Partido Trabalhista, mas sim para este, como mostram as eleições parciais".
Digamos, de passagem, que esses raciocínios provam de modo singular até que ponto se confundiram e não podem deixar de cometer desatinos irreparáveis os mais inteligentes homens da burguesia. É isto que a fará perecer. Nossos camaradas podem até fazer tolices (contanto, é claro, que não sejam muito consideráveis e possam ser reparadas a tempo) e, não obstante, acabarão por triunfar. 0 segundo documento político são as seguintes considerações da comunista "de esquerda" camarada Sylvia Pankhurst:
"...O camarada Inkpin (secretário do Partido Socialista Britânico) denomina o Partido Trabalhista de "a principal organização do movimento da classe operária". Outro camarada do Partido Socialista Britânico expressou ainda com mais relevo o ponto de vista desse partido na Conferência da III Internacional.
"Consideramos o Partido Trabalhista - disse - como a classe operária organizada". Não compartilhamos dessa opinião a respeito do Partido Trabalhista. Ele é muito importante do ponto de vista numérico, embora seus membros sejam; em grande parte, inertes e apáticos; trata-se de operários e operárias que entraram para as trade-unions porque seus companheiros de oficina são trade-unionistas e porque desejam receber seguros e pensões.
Reconhecemos, porém, que a importância numérica do Partido Trabalhista obedece também ao fato de ser esse partido fruto de uma escola de pensamento, cujos limites ainda não foram ultrapassados pela maioria da classe operária britânica, embora se preparem grandes modificações na mentalidade do povo que transformarão brevemente esse estado de coisas... "
"... O Partido Trabalhista Britânico, como as organizações social-patriotas dos demais países, chegará inevitavelmente ao Poder pelo caminho natural do desenvolvimento social. O dever dos comunistas consiste em organizar as forças que derrubarão os social-patriotas, e em nosso país não devemos vacilar nem retardar essa ação. Não devemos dispersar nossas energias aumentando as forças do Partido Trabalhista; seu advento ao Poder é inevitável. Devemos concentrar nossas forças na criação de um movimento comunista que derrote esse partido. Dentro de pouco tempo o Partido Trabalhista estará no governo; a oposição revolucionária deve estar preparada para empreender o ataque contra ele..."
Assim, pois, a burguesia liberal renuncia ao sistema dos "dois partidos" (dos exploradores), consagrado no transcurso da história por uma experiência secular e extremamente proveitoso para os exploradores, considerando necessária a união de suas forças a fim de lutar contra o Partido Trabalhista. Uma parte dos liberais, como os ratos de um navio que afunda, corre para o Partido Trabalhista. Os comunistas de esquerda consideram inevitável a passagem do Poder para as mãos do Partido Trabalhista e reconhecem que a maior parte dos operários está atualmente a favor desse partido. De tudo isso, chegam à estranha conclusão assim formulada pela camarada Sylvia Pankhurst :
"O Partido Comunista não deve assumir compromissos... Deve conservar pura a sua doutrina e imaculada a sua independência frente ao reformismo; sua missão é marchar na vanguarda, sem deter-se ou desviar-se de seu caminho, avançar em linha reta em direção à Revolução Comunista".
Pelo contrário, do fato de a maioria dos operários da Inglaterra ainda seguir os Kerenski e os Scheidemann ingleses de não ter passado "ainda pela experiência de um governo formada por esses homens - experiência que foi necessária tanto na Rússia como na Alemanha para que os operários se passassem em massa para o comunismo deduz-se de modo infalível que os comunistas ingleses devem participar do parlamentarismo, devem ajudar a massa operária de dentro do parlamento a ver na prática os efeitos do governo dos Henderson e dos Snowden, devem ajudar os Henderson e Snowden a derrotarem a coalizão de Lloyd George e Churchill. Proceder de outro modo significa dificultar a marcha da revolução, pois se não se produz uma modificação nas opiniões da maioria da classe operária, a revolução torna-se impossível; e essa modificação se consegue através da experiência política das massas, e nunca apenas com a propaganda. A palavra de ordem: "Avante sem compromissos, sem desviar-se do caminho!" é claramente errada, se quem a propala é uma minoria evidentemente impotente de operários que sabe (ou, pelo menos, deve saber) que dentro de pouco tempo, no caso de, Henderson e Snowden triunfarem sobre Lloyd George e Churchill, a maioria perderá a fé - em seus chefes e apoiará o comunismo (ou, em todo caso, adotará uma atitude de neutralidade e, em sua maioria, de neutralidade simpática em relação aos comunistas). É a mesma coisa que se 10.000 soldados se lançassem ao combate contra 50.000 inimigos no momento em que é necessário "deter-se", "afastar-se do caminho", e até concertar um "compromisso" para esperar a chegada de um reforço prometido de 100.000 homens, que não podem entrar em ação imediatamente. É uma infantilidade própria de intelectuais e não uma tática séria da classe revolucionária.
A lei fundamental da revolução, confirmada por todas as revoluções, e em particular pelas três revoluções russas do século XX, consiste no seguinte: para a revolução não basta que as massas exploradas e oprimidas tenham consciência da impossibilidade de continuar vivendo como vivem e exijam transformações; para a revolução é necessário que os exploradores não possam continuar vivendo e governando como vivem e governam. Só quando os "de baixo" não querem e os "de cima" não podem continuar vivendo à moda antiga é que a revolução pode triunfar. Em outras palavras, esta verdade exprime-se do seguinte modo: a revolução é impossível sem uma crise nacional geral (que afete explorados e exploradores). Por conseguinte, para fazer a revolução é preciso conseguir, em primeiro lugar, que a maioria dos operários (ou, em todo caso, a maioria dos operários conscientes, pensantes, politicamente ativos) compreenda a fundo a necessidade da revolução e esteja disposta a sacrificar a vida por ela ; em segundo lugar, é preciso que as classes dirigentes atravessem uma crise governamental que atraia à política inclusive as massas mais atrasadas (o sintoma de toda revolução verdadeira é a decuplicação ou centuplicação do número de homens aptos para a luta política, homens pertencentes à massa trabalhadora e oprimida, antes apática), que reduza o governo à impotência e. torne possível sua rápida derrubada pelos revolucionários.
Na Inglaterra, e exatamente o discurso de Lloyd George o demonstra, entre outras coisas, desenvolvem-se a olhos vistos as duas condições de uma revolução proletária vitoriosa. E os erros dos comunistas de esquerda representam atualmente um singular perigo precisamente porque observamos em alguns revolucionários uma atitude pouco ponderada, pouco atenta, pouco consciente, pouco reflexiva com relação a cada um desses fatores. Se somos o partido da classe revolucionária, e não um grupo revolucionário, se queremos atrair as massas (sem o que corremos o risco de não passar de simples charlatães) devemos: em primeiro lugar, ajudar Henderson ou Snowden a vencer Lloyd George e Churchill (mais exatamente: devemos obrigar os primeiros a vencer os segundos, pois os primeiros tem medo de sua própria vitória!); em segundo lugar, ajudar a maioria da classe operária a convencer-se por experiência própria de que temos razão, isto é, da incapacidade completa dos Henderson e Snowden, de sua natureza pequeno-burguesa e traidora, da inevitabilidade de sua falência; e, em terceiro lugar, antecipar o momento em que, sobre a base da desilusão produzida pelos Henderson na maioria dos operários, se possa, com grandes probabilidades de êxito, derrubar de golpe o governo dos Henderson.
Se inclusive Lloyd George, político inteligentíssimo e resoluto, que não é pequeno burguês, mas sim grande burguês, debilita-se cada vez mais (com toda a burguesia), ontem por suas "rusgas" com Churchill e hoje por suas "rusgas" com Asquith, e perde a cabeça, com muito mais facilidade a perderão os Henderson. Falarei de modo mais concreto. Os comunistas ingleses devem, na minha opinião, unificar seus quatro partidos e grupos (todos muito débeis e alguns extraordinariamente débeis) num Partido Comunista único, baseado nos princípios da III Internacional e da participação obrigatória no parlamento. O Partido Comunista propõe aos Henderson e Snowden um "compromisso", um acordo eleitoral: marchemos juntos contra a coalizão de Lloyd George e os conservadores, repartamos os postos no parlamento proporcionalmente aos votos dados pelos operários ao Partido Trabalhista ou aos comunistas (não nas eleições, mas numa votação especial) conservemos a mais completa liberdade, de agitação, propaganda e ação política. Sem esta última condição é impossível, naturalmente, fazer a aliança, pois seria uma traição. Os comunistas ingleses devem reivindicar e alcançar a mais completa liberdade, que lhes permita, desmascarar os Henderson e Snowden, de modo tão absoluto como o fizeram (durante 15 anos, de 1903 a 1917) os bolcheviques russos em relação aos Henderson e Snowden da Rússia, isto é, os mencheviques.
Se os Henderson e Snowden aceitarem a aliança nessas condições, sairemos ganhando, pois o que nos interessa não é, absolutamente, o número de cadeiras no parlamento. Não é esse o nosso objetivo; nesse ponto seremos transigentes (enquanto os Henderson e, sobretudo, seus novos amigos - ou seus novos amos - os liberais que ingressaram no Partido Trabalhista, correm atrás disso mais que de qualquer outra coisa). Teremos ganho porque levaremos nossa agitação às massas num momento em que o próprio Lloyd George as terá "irritado', e ajudaremos não só o Partido Trabalhista a formar mais depressa o seu governo, como também as massas a compreenderem melhor toda nossa propaganda comunista, que realizaremos contra os Henderson sem nenhuma limitação, sem nada silenciar.
Se os Henderson e Snowden repelirem a aliança conosco, nessas condições, teremos ganho ainda mais, pois teremos mostrado na hora às massas (levem em conta que inclusive dentro do Partido Trabalhista Independente, puramente menchevique, completamente oportunista, as massas são partidárias dos Soviets) que os Henderson preferem sua intimidade com os capitalistas à união de todos os trabalhadores. Teremos ganho imediatamente ante a massa, a qual, sobretudo depois das explicações brilhantíssimas, extremamente acertadas e úteis (para o comunismo) dadas por Lloyd George, simpatizará com a idéia da união de todos os .operários contra a coalizão de Lloyd George com os conservadores. Teremos ganho desde o primeiro momento, pois teremos demonstrado às massas que os Henderson e Snowden receiam vencer Lloyd George, receiam tomar o Poder sozinhos e aspiram a conseguir em segredo o apoio de Lloyd George, que estende a mão abertamente aos conservadores contra o Partido Trabalhista. É preciso lembrar que na Rússia, depois da revolução de 27 de fevereiro de 1917 (calendário antigo), o êxito da propaganda dos bolcheviques contra os mencheviques e social-revolucionários (isto é, os Henderson e Snowden russos) foi devido precisamente às mesmas circunstâncias. Dizíamos aos mencheviques e aos social-revolucionários: tomem todo o Poder sem a burguesia, posto que vocês têm a maioria nos Soviets (no I Congresso dos Soviets de toda a Rússia, celebrado em junho de 1917, os bolcheviques não tinham mais que 13% dos votos). Mas os Henderson e Snowden russos tinham medo de tomar o Poder sem a burguesia, e quando esta adiou as eleições para a Assembléia Constituinte porque sabia perfeitamente que os social-revolucionários e os mencheviques alcançariam a maioria(2) (ambos formavam um bloco político muito estreito, representavam praticamente uma só democracia pequeno-burguesa), os social-revolucionários e os mencheviques ficaram impotentes para lutar com energia e até o fim contra esses adiamentos.
Se os Henderson e Snowden se negassem a formar uma aliança com os comunistas, estes sairiam ganhando de imediato, pois conquistariam a simpatia das massas, enquanto os Henderson e Snowden ficariam desacreditados. Pouco nos importaria então perder algumas cadeiras no parlamento por causa disso. Só apresentaríamos candidatos num número ínfimo de circunscrições absolutamente seguras, isto é, onde isto não representasse a vitória de um liberal contra um trabalhista. Realizaríamos a nossa campanha eleitoral distribuindo volantes de propaganda do comunismo e convidando o povo, em todas as circunscrições em que não apresentássemos candidato, a votar no trabalhista contra o burguês. Enganam-se os camaradas Sylvia Pankhurst e Gallacher se vêem nisso uma traição ao comunismo ou uma renuncia à luta contra os social-traidores. Pelo contrário, não há dúvida de que a causa da revolução sairia ganhando.
Hoje em dia, é muito difícil para os comunistas ingleses inclusive aproximar-se das massas, fazer com que elas os ouçam. Contudo, se me apresentar como comunista e, ao mesmo tempo, convidar a votar em Henderson contra Lloyd George, é certo que serei ouvido. E poderei explicar de modo acessível não só por que os Soviets são melhores que o parlamento e a ditadura do proletariado melhor que a ditadura de Churchill (mascarada sob o rótulo de "democracia", burguesa), como também por que eu gostaria de sustentar Henderson com meu voto do mesmo modo que a corda sustenta o enforcado; que a aproximação dos Henderson a um governo formado por eles mesmos demonstrará a minha razão, atrairá as massas para o meu lado e acelerará a morte política dos Henderson e Snowden, exatamente como aconteceu com seus correligionários na Rússia e na Alemanha.
E se replicarem dizendo que esta tática é muito "astuta" ou complicada, que as massas não a compreenderão, que dispersará e desagregará nossas forças impedindo-nos de concentrá-las, na revolução soviética, etc., responderei aos meus contestadores "de esquerda": não atribuam às massas o seu próprio doutrinarismo ! É de supor-se que na Rússia as massas não são mais cultas, mas, pelo contrário, que são menos cultas que na Inglaterra. Apesar disso, compreenderam os bolcheviques; e, em vez de prejudicá-los, favoreceu-os o fato de, nas vésperas da revolução soviética de setembro de 1917, comporem, listas de candidatos seus ao parlamento burguês (à Assembléia Constituinte) e tomarem parte, no dia seguinte à revolução soviética de novembro de 1917, nas eleições para essa mesma Constituinte, dissolvida por eles no dia 5 de janeiro de 1918.
Não posso examinar pormenorizadamente a segunda divergência entre os comunistas ingleses, consistente em se devem ou não aderir ao Partido Trabalhista. Tenho pouquíssimos dados sobre essa questão extremamente complexa, dada a extraordinária originalidade do "Partido Trabalhista" Britânico, muito pouco parecido estruturalmente com os habituais partidos políticos do continente europeu. Mas não há dúvida de que, em primeiro lugar, também incorre inevitavelmente em erro quem deduz a tática do proletariado revolucionário de princípios como este: "0 Partido Comunista deve conservar pura a sua doutrina e imaculada a sua independência frente ao reformismo; sua missão é marchar na vanguarda, sem deter-se ou desviar-se de seu caminho, avançar em linha reta em direção à Revolução Comunista". Princípios como este só fazem repetir o erro dos comunardos-blanquístas franceses, que em 1874 proclamavam a "negação" de todo compromisso e de toda etapa intermediária. Em segundo lugar, não há dúvida de que nesse ponto a tarefa consiste, como sempre, em saber aplicar os princípios gerais e fundamentais do comunismo às peculiaridades das relações entre as classes e os partidos, às peculiaridades do desenvolvimento objetivo rumo ao comunismo, próprias a cada pais e que é necessário saber estudar, descobrir e prever.
Mas é preciso falar a respeito disso não só em relação ao comunismo inglês, mas sim em relação às conclusões gerais que se referem ao desenvolvimento do comunismo em todos os países capitalistas. Este é o tema que vamos abordar agora.

4 comentários:

Anónimo disse...

CRN,...desculpa lá mas há aqui umas coisas que não dão para eu perceber.

O Zorze diz: que se deve dar o país a uma "Organização política de cariz social humanista e justa",...sabes de que se trata isto ???

O Mescalero no meu blog diz...que é má idéia entregar de mão beijada seja a quem for, os destinos da nossa vida. que todos os partidos já demonstraram que não servem....metendo no mesmo saco o PCP.

Um idiota que dá pelo nome de Ferroadas diz esta pérola : só o povo tem a sabedoria, o talento e a autoridade para se auto-governar.

Caro CRN e agora pergunto eu,...o que é isto ? é com este pessoal que queres avançar ? se eles são líricos ou incultos políticamente falando é lá com eles,...mas eu não arrisco alinhar com estes lunáticos que só favorecem a extrema direita como sabes. Por favor, vamos falar de coisas sérias. Abraço!

Mário Pinto disse...

Mugabe,
A falta de conhecimento, o medo da responsabilidade, a alienação ou os inúmeros problemas pessoais (endógenos ou exógenos), geram discursos deste tipo. Solidariedade com estes seres humanos é o esclarecimento.

A revolução é hoje.

Ana Camarra disse...

CRN

Inglaterra foi o berço da Revolução Industrial, curiosamente fala-se pouco das lutas dos trabalhadores lá, mas foi dos primeiros sítios onde a consciência de classes começou a tomar forma, sob a forma de luta.
Pois o Partido Trabalhista, emergiu dessas lutas, mas tal como outros congéneres rapidamente se despiu do Marxismo e assumiu a nova roupagem que os caracteriza…
Pois os “liberais” fogem muito depressa, tal qual os ratos de porão…

Quanto á música de hoje, a universalidade de ser trabalhador, uma musica de Sérgio Godinho.


“Levanto-me, acordo cedo
vou para um trabalho que para mim não tem segredos
a minha vida não é para atirar ao lixo
não sou coisa nem sou bicho
nem sou carne para canhão, não!

Quem me usa não me merece
só merece o meu desprezo quem abusa
da minha força e da minha competência
e até mesmo da impaciência
de dar de comer aos meus filhos.

É a trabalhar
que a gente pga o jantar
mais foi a trabalhar
que a gente fez a faca para o cortar.

Se hoje ainda vivo afaimado
quem me domina tem os seus dias contados
a minha luta não é sozinho que a faço
tem tantos no mesmo passo
braço a braço somos muitos.

E à noite, quando adormeço
É como fazer a viagem de regresso
para um outro dia, um amanhã mais libertado
com as correntes do passado
e a certeza no futuro.

É a trabalhar
que a gente pga o jantar
mais foi a trabalhar
que a gente fez a faca para o cortar.”

Beijos

Anónimo disse...

Ana,
A inglaterra, ou quem por lá andou, foram os preconizadores de muitos aspectos postivos para a humanidade, mas, estou convencido que foram mais os negativos.
E isso mesmo:"Se hoje ainda vivo afaimado
quem me domina tem os seus dias contados
a minha luta não é sozinho que a faço
tem tantos no mesmo passo
braço a braço somos muitos."

A revolução é hoje!