terça-feira, janeiro 18, 2005

É à buba!

Uma empresa privada resolveu sensibilizar os condutores portugueses para «o novo Código da Estrada», que ainda não foi promulgado, sem que nenhuma das entidades com responsabilidades nas estradas portuguesas soubesse ou actuasse.

«Para sua segurança conheça o novo Código da Estrada», pode ler-se em letras garrafais em várias estradas do país. Por exemplo, na Segunda Circular, em Lisboa, ou no IP4, a Norte. Mas o novo Código não tem o aval do Presidente da República e não se sabe quando avançará. Nada que impeça a editora privada de sensibilizar os condutores para algo que pode não existir tão cedo.

Os cartazes são da «total responsabilidade das Segurança Rodoviária Edições», confirmou ao PortugalDiário Paulo Pereira, director de marketing da empresa. A editora decidiu afixar estes cartazes antes de o novo Código da Estrada ser promulgado por uma questão de tempo: «A empresa que imprime os cartazes também trabalha para o PS e PSD e, nesta época de campanha, o trabalho é muito, por isso decidimos correr o risco e mandar fazer já os cartazes, antes que não houvesse tempo», explicou o responsável. «Foi uma iniciativa nossa», sublinhou.

Confrontado com o facto de o novo Código ainda não ter sido promulgado, Paulo Pereira defendeu que «a empresa só fez "outdoors" depois de o Código ter sido aprovado em Conselho de Ministros». E adiantou: «Já temos outro pronto, se for preciso trocá-lo».

A empresa têm já "outdoors" autorizados por autarquias, pelo que não necessitam de pedir autorização para um cartaz específico, argumenta: «Temos um certo número de "outdoors" fixos e vamos mudando a mensagem».

«Como não é publicidade não temos de pedir a autorização sempre que mudamos a mensagem. E não temos de pagar taxa porque não estamos a publicitar um produto», explicou. A Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP) recebeu com espanto esta informação. Ao PortugalDiário reconheceram que, em muitos casos, a PRP é «obrigada» a pagar uma taxa de publicidade.

O cartaz está à vista de todos, mas as entidades responsáveis pela prevenção rodoviária desconheciam a sua existência e a autoria. Fonte da PRP garantiu ao PortugalDiário: «Os cartazes não são nossos». E remeteu uma eventual responsabilidade para a Direcção-Geral de Viação (DGV). Desta entidade, a mesma resposta: «Esses cartazes não são nossos», disse fonte da direcção.

Já o Ministério da Administração Interna (MAI), segundo o gabinete de imprensa do secretário de Estado, Nuno Magalhães, diz não ter conhecimento dos cartazes, apesar de conhecer a editora privada em causa. «Não temos responsabilidade, nem tínhamos conhecimento da sua existência». O gabinete da tutela adianta ainda que não sabe se é possível fazer alguma coisa para corrigir o erro.

As explicações da Câmara Municipal de Lisboa (CML) revelam mais uma vez o total desconhecimento da origem dos cartazes. Fonte da CML garantiu ao PortugalDiário que «não foi dada autorização para a afixação desses cartazes», contrariando as declarações do responsável da empresa. Aquela fonte adiantou que «é preciso pedir autorização para a afixação de cartazes no espaço público, nomeadamente ao Departamento de Gestão do Espaço Público. E essa autorização não foi pedida».

O novo Código da Estrada foi aprovado em Conselho de Ministros, no dia 12 de Dezembro de 2004 e estava previsto que entrasse em vigor em Janeiro de 2005, o que não aconteceu.

As associações de consumidores consideram que o novo código tem normas que violam a Constituição Portuguesa, porque a obrigação de pagar coimas no momento da autuação impede o direito ao princípio do contraditório e atribui às polícias poderes que não estão consagrados na lei fundamental.

O diploma está a ser analisado por Belém, que tem até dia 12 de Fevereiro para promulgar a norma ou pedir a intervenção do Tribunal Constitucional.

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