quinta-feira, junho 09, 2005

Depois de tocar no fundo... Só cavando!

Dez anos deitados fora, ou seja, cerca de 15% do tempo médio de vida de um português, foi o resultado conjunto das políticas de desenvolvimento económico dos últimos três governos.

Os dados mais recentes do Eurostat, o gabinete de estatística da União Europeia, mostram que o rendimento per capita português, ajustado a diferenciais de poder de compra, foi em 2004 exactamente o mesmo que o verificado em 1995: 73% da média dos 25 parceiros da União Europeia (UE-25).
No mesmo período, a Espanha passou de 87% da média da UE-25 para 98% e a Grécia de 72% para 82%, tendo ultrapassado Portugal em 2002. O Luxemburgo e a Irlanda são os países com melhores desempenhos. Entre 1995 e 2004, o PIB per capita do Luxemburgo passou de 179% para mais do dobro da média da UE-25. Por seu lado a Irlanda que estava na média há 10 anos atrás, passou agora para 139%.
Os dados são pouco animadores também quando os comparamos com os 10 países do alargamento: a economia portuguesa foi ultrapassada pela Eslovénia, a República Checa já está nos nossos calcanhares, e países como a Letónia, Lituânia e a Hungria estão a evoluir significativamente.


“ Em breve mais nos ultrapassarão”
Quem o afirma é João Ferreira do Amaral, professor do ISEG, que não se mostra surpreendido, mas apenas preocupado com estes valores. “Este é o resultado da adesão à moeda única quando Portugal não estava preparado, nem em termos de infra-estruturas, nem de condições macroeconómicas”, defende, aludindo à elevada inflação que Portugal experimentava quando aderiu ao euro. “Estamos na ressaca desse processo de ajustamento. É uma crise sem precedentes”, acrescenta ainda.
Segundo o professor do ISEG esta tendência negativa agravar-se-á nos próximos anos, uma vez que os países de Leste gozam de factores mais atractivos para o investimento directo estrangeiro e têm inflações mais baixas que a portuguesa na altura. João Ferreira do Amaral lembra ainda os efeitos negativos que as transformações no comércio internacional trarão a Portugal.
Apesar de partilharem as mesmas preocupações, o ex-ministro das Finanças, Eduardo Catroga, e o professor da Universidade Católica, João César das Neves, acolhem apenas em parte as justificações de Ferreira do Amaral.
Para Catroga a estagnação da economia portuguesa deve-se, essencialmente, à inexistência de reformas estruturais tanto no sector público como no empresarial. “Temos um grave e conhecido problema de competitividade e produtividade, e que os Governos, em especial os do Eng. Guterres, não atacaram”. “Foram dez anos perdidos”, acrescenta.
César das Neves afina pelo mesmo diapasão. “Os dados não são uma surpresa. Depois de dez anos de evolução muito positiva, os últimos dez foram de estagnação”. Quando procura as causas para esta evolução, o professor da Católica não hesita em defender que Portugal não aproveitou o excelente momento económico internacional no final da década de 90: “Quando o Eng. António Guterres chegou ao poder decidiu mudar as prioridades, relegando o crescimento para segundo plano. Os resultados estão à vista”. César das Neves também não concorda que as explicações possam ser encontradas na adesão ao euro: “Se não aderíssemos ao euro teríamos mais um instrumento de política, mas o que aconteceria seria apenas uma transferência de rendimento, prejudicando os trabalhadores.Além disso, teríamos de pagar o preço da não adesão, como por exemplo, enfrentarmos elevadas taxas de juro”.
Também Teodora Cardoso entende estes valores com uma naturalidade que só pode deixar os portugueses muito preocupados sobre as opções de desenvolvimento económico dos sucessivos governos: “O facto de o rendimento per capita português estar a baixar, mesmo em relação ao crescimento medíocre da UE, nada tem de surpreendente”, e explica que este é o resultado “da visão da economia numa óptica estrita de curto prazo, onde se inseriram as ajudas comunitárias que, temporariamente, criaram uma aparência de convergência real”.
No momento essencial de definição das opções de política económica para os próximos anos, estes valores colocam uma responsabilidade adicional sobre o Executivo de José Sócrates.

Sem comentários: