O Processo de Bolonha e as opções federalistas para a União Europeia
À parte a benevolência do discurso dos que viam ou ainda vêem no processo de Bolonha a resposta para as dificuldades que se vivem no Ensino Superior, hoje está mais claro que estamos perante um processo que visa uma profunda transformação das qualificações académicas e profissionais. Os objectivos reais são o encurtamento das frequências escolares para as massas, a estratificação de qualificações e de instituições de Ensino e de Investigação dentro de cada país e entre países, a selecção de melhores estudantes, isto é os com melhor “desempenho”, para as “grandes escolas” Europeias, nos países do núcleo duro da velha Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, agora também da industria aeroespacial, biotecnologia, telecomunicações, etc.Mais crítica do que a harmonização de conteúdos e formas de ensino ou aprendizagem, que polarizam a atenção da esfera académica, para as opções federalistas do Espaço Europeu do Ensino Superior são mais determinantes as normas, os critérios, os procedimentos de avaliação, a acreditação e auditoria centralizadas, que se perfilam no curso do processo. Essa é uma face mais silenciosa do processo de Bolonha, onde interesses corporativos empresariais ou industriais poderão mais seriamente exercer-se, longe de qualquer vigilância democrática. Para isso, a actual rede de estruturas nacionais cooperantes, ainda responsáveis perante as autoridades nacionais, European Network for Quality Assurance in Higher Education (ENQA), foi arvorada em cúpula de uma pirâmide acima das autoridades nacionais, sob a designação de European Association for Quality Assurance in Higher Education, uma agência com jurisdição Europeia, com padrões, procedimentos e orientações previsivelmente únicos, centralizadores e federalistas.Em 2010, o Espaço Europeu do Ensino Superior será regulado pela ENQA, na cúpula das instituições de avaliação e acreditação nacionais, segundo indicadores e critérios comuns. As agências de avaliação exercerão funções reguladoras análogas às exercidas por outros organismos em outros sectores de “actividade económica”; aliás os conceitos de qualidade e de garantia de qualidade surgiram nas actividades económicas industriais e permeiam agora as diversas actividades sócio-económicas, justificadas na óptica de defesa dos direitos do “consumidor”.Registamos os erros de princípio e os desgastes sociais que decorrem da política educativa de que a "adequação" a Bolonha é um evidente pretexto; a manutenção de uma política de subfinanciamento de todo o sistema do Ensino Superior, a ausência de investimentos para realizar de facto uma reforma educativa, o enorme agravamento da comparticipação dos estudantes no financiamento da sua formação e a carência de acção social correspondente, a escassa participação organizada dos docentes no plano nacional e internacional, e a escassa participação organizada dos estudantes nos planos nacional e de estabelecimento de ensino. Cada vez mais o processo é dirigido por um executivo comandado pela Comissão Europeia cumprindo exclusivamente os objectivos neoliberais e federalistas que se propõe.A reforma de Bolonha invoca uma mudança de “paradigma” mas o que é concreto é a redução do financiamento público (mais uma vez com cortes muito significativos no Orçamento do Estado) para o funcionamento do sistema de Ensino Superior Público e o vazio para o necessário reforço de investimento que a mudança de “paradigma” exigiria para se tornar operacional. Os três ciclos são os que geralmente já existiam; o que faz a diferença é a redução da extensão do ciclo de formação inicial, ignorando a especificidade de cada sistema nacional de ensino a montante, e insistindo na qualificação para a “empregabilidade” a jusante. O que seria no anterior sistema uma licenciatura, varia agora entre uma formação de 1.º ciclo ou de 2.º ciclo, consoante existe ou não profissão regulamentada no plano Europeu, de outro modo indiferente ao conteúdo e finalidade concreta da formação. O discurso é decorado com termos aparentemente neutros ou até mesmo positivos, à luz do “pensamento único” que o capital quer ver dominante. Ele é a “sociedade do conhecimento”, a harmonização de qualificações, a internacionalização, a mobilidade de estudantes (actualmente apenas cerca de 1% dos estudantes portugueses participam em programas de mobilidade!), docentes e investigadores, a empregabilidade, a formação ao longo da vida, etc. Mas o conteúdo real de tudo isto é a irreversível tendência para a “formação” de força de trabalho em subalternização da “instrução” e esquecendo a “educação”; o fim de carreiras estáveis ou previsíveis; a precarização do posto de trabalho, a flexibilização da força de trabalho, a perda de direitos e garantias sociais para um emergente “proletariado intelectual”; em paralelo com a “produção” acelerada de uma elite de gestores, investigadores e quadros técnicos altamente disputados e remunerados, porque a sua disponibilidade escasseia a nível mundial.Como se a mobilidade de estudantes, professores e docentes não fosse apanágio do Ensino Superior desde a Idade Média até ao presente, como se não tivesse acabado de ser celebrada (em Lisboa, em Abril de 1997) uma Convenção no Quadro do Conselho da Europa e da UNESCO (a que até à data aderiram 42 países) consagrando o reconhecimento recíproco de qualificações escolares à entrada e à saída do Ensino Superior. Como se os estabelecimentos de ensino devessem e pudessem assumir responsabilidade na empregabilidade, ainda menos no desemprego ou subemprego ou na reconversão profissional decorrente de fusões e aquisições ou de deslocalizações, do foro puramente empresarial.Como se a harmonização anunciada precisasse, de facto, de violentar a soberania de cada estado membro, para mais em matéria tão sensível, pois que não só atinge a sua força de trabalho como também constrange o seu potencial intelectual e a sua diferenciação cultural, e, bem assim, de ferir a autonomia estrutura e funcionamento dos estabelecimentos de ensino
À parte a benevolência do discurso dos que viam ou ainda vêem no processo de Bolonha a resposta para as dificuldades que se vivem no Ensino Superior, hoje está mais claro que estamos perante um processo que visa uma profunda transformação das qualificações académicas e profissionais. Os objectivos reais são o encurtamento das frequências escolares para as massas, a estratificação de qualificações e de instituições de Ensino e de Investigação dentro de cada país e entre países, a selecção de melhores estudantes, isto é os com melhor “desempenho”, para as “grandes escolas” Europeias, nos países do núcleo duro da velha Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, agora também da industria aeroespacial, biotecnologia, telecomunicações, etc.Mais crítica do que a harmonização de conteúdos e formas de ensino ou aprendizagem, que polarizam a atenção da esfera académica, para as opções federalistas do Espaço Europeu do Ensino Superior são mais determinantes as normas, os critérios, os procedimentos de avaliação, a acreditação e auditoria centralizadas, que se perfilam no curso do processo. Essa é uma face mais silenciosa do processo de Bolonha, onde interesses corporativos empresariais ou industriais poderão mais seriamente exercer-se, longe de qualquer vigilância democrática. Para isso, a actual rede de estruturas nacionais cooperantes, ainda responsáveis perante as autoridades nacionais, European Network for Quality Assurance in Higher Education (ENQA), foi arvorada em cúpula de uma pirâmide acima das autoridades nacionais, sob a designação de European Association for Quality Assurance in Higher Education, uma agência com jurisdição Europeia, com padrões, procedimentos e orientações previsivelmente únicos, centralizadores e federalistas.Em 2010, o Espaço Europeu do Ensino Superior será regulado pela ENQA, na cúpula das instituições de avaliação e acreditação nacionais, segundo indicadores e critérios comuns. As agências de avaliação exercerão funções reguladoras análogas às exercidas por outros organismos em outros sectores de “actividade económica”; aliás os conceitos de qualidade e de garantia de qualidade surgiram nas actividades económicas industriais e permeiam agora as diversas actividades sócio-económicas, justificadas na óptica de defesa dos direitos do “consumidor”.Registamos os erros de princípio e os desgastes sociais que decorrem da política educativa de que a "adequação" a Bolonha é um evidente pretexto; a manutenção de uma política de subfinanciamento de todo o sistema do Ensino Superior, a ausência de investimentos para realizar de facto uma reforma educativa, o enorme agravamento da comparticipação dos estudantes no financiamento da sua formação e a carência de acção social correspondente, a escassa participação organizada dos docentes no plano nacional e internacional, e a escassa participação organizada dos estudantes nos planos nacional e de estabelecimento de ensino. Cada vez mais o processo é dirigido por um executivo comandado pela Comissão Europeia cumprindo exclusivamente os objectivos neoliberais e federalistas que se propõe.A reforma de Bolonha invoca uma mudança de “paradigma” mas o que é concreto é a redução do financiamento público (mais uma vez com cortes muito significativos no Orçamento do Estado) para o funcionamento do sistema de Ensino Superior Público e o vazio para o necessário reforço de investimento que a mudança de “paradigma” exigiria para se tornar operacional. Os três ciclos são os que geralmente já existiam; o que faz a diferença é a redução da extensão do ciclo de formação inicial, ignorando a especificidade de cada sistema nacional de ensino a montante, e insistindo na qualificação para a “empregabilidade” a jusante. O que seria no anterior sistema uma licenciatura, varia agora entre uma formação de 1.º ciclo ou de 2.º ciclo, consoante existe ou não profissão regulamentada no plano Europeu, de outro modo indiferente ao conteúdo e finalidade concreta da formação. O discurso é decorado com termos aparentemente neutros ou até mesmo positivos, à luz do “pensamento único” que o capital quer ver dominante. Ele é a “sociedade do conhecimento”, a harmonização de qualificações, a internacionalização, a mobilidade de estudantes (actualmente apenas cerca de 1% dos estudantes portugueses participam em programas de mobilidade!), docentes e investigadores, a empregabilidade, a formação ao longo da vida, etc. Mas o conteúdo real de tudo isto é a irreversível tendência para a “formação” de força de trabalho em subalternização da “instrução” e esquecendo a “educação”; o fim de carreiras estáveis ou previsíveis; a precarização do posto de trabalho, a flexibilização da força de trabalho, a perda de direitos e garantias sociais para um emergente “proletariado intelectual”; em paralelo com a “produção” acelerada de uma elite de gestores, investigadores e quadros técnicos altamente disputados e remunerados, porque a sua disponibilidade escasseia a nível mundial.Como se a mobilidade de estudantes, professores e docentes não fosse apanágio do Ensino Superior desde a Idade Média até ao presente, como se não tivesse acabado de ser celebrada (em Lisboa, em Abril de 1997) uma Convenção no Quadro do Conselho da Europa e da UNESCO (a que até à data aderiram 42 países) consagrando o reconhecimento recíproco de qualificações escolares à entrada e à saída do Ensino Superior. Como se os estabelecimentos de ensino devessem e pudessem assumir responsabilidade na empregabilidade, ainda menos no desemprego ou subemprego ou na reconversão profissional decorrente de fusões e aquisições ou de deslocalizações, do foro puramente empresarial.Como se a harmonização anunciada precisasse, de facto, de violentar a soberania de cada estado membro, para mais em matéria tão sensível, pois que não só atinge a sua força de trabalho como também constrange o seu potencial intelectual e a sua diferenciação cultural, e, bem assim, de ferir a autonomia estrutura e funcionamento dos estabelecimentos de ensino
6 comentários:
CRN
Pois este é um aspecto sinistro e quase desconhecido de toda esta história...
De facto a coordenação deste ataque centralizado a modificar os sectores que podem influenciar a capacidade humana é simplesmente brutal.
Medonho
Assustador
bjks
Caro CRN...estes tipos neo-liberalistas dão-nos a volta sem darmos por isso....a sofisticação deles é de arrepiar, toda a forma de manipulação é feita de pantufas, sem barulhos, sem dúvida assustador !! Abraço!
Olá Ana,
Que solução nos resta, a revolução está aí, hoje, em cada um de nós, é necessária a mobilização do povo, agora!
Cumprimentos.
Olá Mugabe,
Cabe-nos a nós denunciar esta tentativa de aborregamento. Por muito que levantêmos a voz, se não conseguirmos nada, se permitirmos este projecto, dentro de alguns anos, poucos, será uma realidade, o povo mais perto das ovelhas!
Cumprimentos.
Crn...a selecção musical está brutal...o teu blog está a ficar com atractivos que o tornam incontronável....Abraço!!
Olá Mugabe,
Agradeço a opinião, no futuro a tónica será a mesma, olhar para o mundo à procura de quem o queira mudar.
Cumprimentos.
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