sábado, agosto 16, 2008

Processo de Bolonha - Documento do Grupo Trabalho PCP para questões Ensino Superior III

Como se o “processo de Bolonha” houvesse de facto caminhado no sentido da anunciada harmonização, o que não se verifica, antes mantendo as dificuldade objectivas de comparabilidade de qualificações (ausentes da adopção a nível Europeu de um elenco comum de áreas científicas e de um padrão inequívoco de unidade de credito, bem como termos de referencia mínimos comuns para a atribuição de grau em cada domínio de conhecimento e nível de qualificação) e a extensão dos ciclos de formação continuando diferentes entre países. Quando afinal uma convenção sobre esses instrumentos básicos de comparação e aferição seria o caminho directo para atingir a comparabilidade de facto.Como se o processo de reforma do Ensino Superior pudesse ter oportunidade de sucesso sem a participação directa e a cooperação, desde as fases iniciais do seu desenvolvimento, das universidades e politécnicos, das ordens profissionais, dos sindicatos de professores e das sociedades científicas e dos estudantes organizados nas suas associações e participando nos órgãos dos estabelecimentos de ensino. A Reforma do Ensino Superior promovida pelo Governo SocialistaA situação do Ensino Superior português é complexa e agravada pela artificiosa divisão binária universidades/politécnicos teimosamente mantida por sucessivos Governos, que todavia serão agora submetidos a um mesmo padrão de avaliação. Com a opção, insidiosamente imposta, por um primeiro ciclo de formação (licenciatura) com a duração de três anos, à excepção de alguns poucos cursos em certos domínios formativas (incluindo os cursos de Direito que propuseram o primeiro ciclo de quatro anos), o aluno que finalizar o primeiro ciclo fica com um nível de formação só formalmente apropriado para ingressar no mercado de trabalho (e só formalmente comparável às anteriores licenciaturas). O discurso oficial exige (aos estabelecimentos de ensino) que o primeiro ciclo seja generalista e profissionalizante, enquanto promete (aos estudantes) empregabilidade; insondáveis paradoxos ou cínica ironia.De facto, os estudantes que não prosseguirem os estudos para um segundo ciclo, que serão aqueles com menor poder económico, por força de propinas a “custos reais” (estabeleceu-se a propina anual de 2700 € para o 2º ciclo em cursos da Faculdade de Economia da UNL!) e por ausência de apoios de acção social escolar, só terão acesso a conhecimentos científicos ou técnicos básicos, ou então muito focalizados, ficando para os outros, os que têm poder económico, o acesso à formação avançada e à cultura. Também por isso, numerosos 2.º ciclos actuais (universitários e sobretudo politécnicos) não reunirão condições de acreditação e financiamento. A existência de numeri clausi e de notas mínimas para o 2º ciclo, são também barreiras ao prosseguimento dos estudos. Neste processo de elitização dos segundos ciclos é claro o objectivo de fazer corresponder às elites económicas as elites intelectuais dirigentes do capital.Haverá, claro, dispositivos altamente selectivos da muito escassa acção social escolar, para que os excepcionalmente dotados, sobreviventes de todo o atribulado percurso escolar, possam encorpar o declinante fluxo de trabalhadores intelectuais altamente qualificados, essenciais ao funcionamento de um certo número de “centros de excelência” de Ciência e Tecnologia que alimente a prosperidade da grande indústria Europeia.Entretanto, sobretudo para as Escolas Superiores Politécnicas, o “Ensino Superior curto” proposto pelo FMI para Portugal vem agora aí sob a designação de Cursos de Especialização Tecnológica (CET), a que provavelmente ficarão confinadas as escolas das regiões interiores, com recursos docentes insuficientes ou com número insuficiente de alunos em cursos superiores graduados. As Universidades e os Politécnicos estão já a constatar que o processo de Bolonha é um rolo compressor em marcha que, para além de induzir reformas de ensino problemáticas, está já e irá mais marcadamente reduzir os recursos humanos (docentes, investigadores e funcionários) no sistema de Ensino Superior Público; reduzir o número de cursos autorizados (financiados ou não); reduzir o número de estudantes em formação inicial (com previsível incremento de “novos públicos”, como supostos trabalhadores estudantes que mais provavelmente serão trabalhadores desempregados ou sub-empregados, fruto de “reestruturações” do foro empresarial); acentuar as assimetrias na rede de ensino; e que várias escolas universitárias e muitos estabelecimentos politécnicos serão, se não mesmo extintos, reduzidos ao nível da sobrevivência apendicular. O processo de Bolonha retira autonomia às universidades/politécnicos. Ao impor modelos estritos de funcionamento pedagógico, a autonomia pedagógica fica diminuidíssima, acompanhada pelo facto de a autonomia científica nunca ter chegado a existir, por falta de investimentos direccionados e por ausência de componente investigativa na fórmula de financiamento do ensino superior pelo Orçamento do Estado, que permitissem às instituições prosseguir políticas cientificas autónomas.Os impactos sobre a população escolar e sobre as instituições de ensino superior serão particularmente sentidos fora dos maiores pólos populacionais, confluindo também para a desertificação humana das regiões deprimidas (como estão sendo o encerramento de hospitais, maternidades e centros de saúde, e de escolas básicas e secundárias “sem condições” na óptica do Governo).Neste quadro, devido à mudança de centralidade da formação disponibilizada pelos docentes para a aquisição de competências profissionalizantes por parte dos alunos e a redução do período de frequência obrigatória para obtenção do 1.º grau, antevê-se uma substancial rarefacção dos tempos lectivos, não compensada por um desejável incremento do esforço de investigação científica, para a qual é também notória a escassez de recursos. Pelo que é de antecipar que o governo pretende reduzir o Corpo Docente. Esta diminuição que se fará sentir sobretudo nas camadas mais jovens do Corpo Docente por razões de vínculo e de habilitações formais, articulada com o envelhecimento progressivo deste, configura uma real possibilidade de implosão de diversos estabelecimentos.Acima de tudo o mais, o distante silêncio do ministério a quem compete e basta emitir, de quando em quando, uma nova lei que vai confirmando uma rota neoliberal há muito premeditada, para tanto marginalizando os actores concretos do sistema de ensino português e o sentido histórico da sua auto-construção. Em Resolução do Conselho de Ministros (n.º 39/2006 de 21 de Abril) o Governo prossegue o “processo de reestruturação da Administração Pública no sentido preconizado no seu Programa e no Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de 2005 a 2009”, para mais adiante n.º 24 f ) e g) anunciar: “Serão extintos (…) o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (…) Prevê-se a criação (…) de uma agência de acreditação e avaliação do Ensino Superior (…) após a conclusão do processo de avaliação que se encontra a ser realizado pela OCDE e pela ENQA”.A investigação científica também encontra o seu contexto agravado. O divórcio entre os mecanismos de financiamento para o Ensino e para a Investigação contradiz a sua desejável unidade funcional e orgânica, o que se repercute negativamente sobretudo na qualidade de ensino de 1.º Ciclo, oferecido segundo uma lógica de oportunidade conjuntural e concorrencial, e previsivelmente também na rede de oferta de ensino de 2.º Ciclo, já que numerosos estabelecimentos de ensino (sobretudo politécnicos) verão coarctadas (e não acreditadas) as suas ofertas de ensino pós-graduado por insuficiência de qualificações e recursos instalados.A desonestidade do discurso da sociedade do conhecimento, do progresso económico e da coesão social (em que assenta todo o texto da Estratégia de Lisboa), encontramo-la bem patente em Portugal, quando observamos a situação chocante de milhares de jovens doutorados, cuja formação foi apoiada por fundos comunitários ao longo da última década e meia, na sua larga maioria a trabalhar agora em condições precárias, não obstante a escassez de investigadores e outros quadros especializados na Administração Pública e nas empresas, a ponto de ser real o desemprego qualificado e a fuga de cérebros portugueses para o estrangeiro (como a OCDE reconhece).

4 comentários:

Ana Camarra disse...

CRN

Desta história toda tira-se o seguinte arranjou-se uma forma ardilosa de toda a gente ter de fazer pós-graduação, porque senão a licenciatura é pouco credível.
Como tal paga-se.
Como tal os grandes crânios, os que dão nas vistas são sugados para outros lados rapidamente.
É isso, não é?!

Para acompanhar tudo fazem falta uns Casimiros…



Estimado ouvinte, já que agora estou consigo
Peço apenas dois minutos de atenção
É pra contar a história de um amigo
Casimiro Baltazar da Conceição

O Casimiro, talvez você não conheça
a aldeia donde ele vinha nem vem no mapa
mas lá no burgo, por incrível que pareça
era, mais famoso que no Vaticano o Papa

O Casimiro era assim como um vidente
tinha um olho mesmo no meio da testa
isto pra lá dos outros dois é evidente
por isso façamos que ia dormir a sesta

Ficava de olho aberto
via as coisas de perto
que é uma maneira de melhor pensar
via o que estava mal
e como é natural
tentava sempre não se deixar enganar
(e dizia ele com os seus botões:)

Cuidado, Casimiro
cuidado com as imitações
Cuidado, minha gente
Cuidado justamente com as imitações

Lá na aldeia havia um homem que mandava
toda a gente, um por um, por-se na bicha
e votar nele e se votassem lá lhes dava
um bacalhau, um pão-de-ló, uma salsicha

E prometeu que construía um hospital
Uma escola e prédios de habitação
e uma capela maior que uma catedral
pelo menos a julgar pela descrição

Mas... O Casimiro que era fino do ouvido
tinha as orelhas equipadas com radar
ouvia o tipo muito sério e comedido
mas lá por dentro com o rabinho a dar, a dar

E... punha o ouvido atento
via as coisas por dentro
que é uma maneira de melhor pensar
via o que estava mal
e como é natural
tentava sempre não se deixar enganar
(e dizia ele com os seus botões:)

Cuidado, Casimiro
cuidado com as imitações
Cuidado, minha gente
Cuidado justamente com as imitações

Ora o tal tipo que morava lá na aldeia
estava doido, já se vê, com o Casimiro
de cada vez que sorria à plateia
lá se lhe viam os dentes de vampiro

De forma que pra comprar o Casimiro
em vez do insulto, do boicote, da ameaça
disse-lhe: Sabe que no fundo o admiro
Vou erguer-lhe uma estátua aqui na praça

Mas... O Casimiro que era tudo menos burro
tinha um nariz que parecia um elefante
sentiu logo que aquilo cheirava a esturro
ser honesto não é só ser bem falante

A moral deste conto
vou resumi-la e pronto
cada qual faz o que melhor pensar
Não é preciso ser
Casimiro pra ter
sempre cuidado pra não se deixar levar.


Beijocas

Anónimo disse...

Olá Ana,
Grande Casimiro!

Cumprimentos.

Anónimo disse...

É para ser cada vez mais o país do faz de conta....! Abraço!

Anónimo disse...

Olá Mugabe,
O país do faz de conta não existe.